
Sempre que estou em uma stação de trem é o acordeon que parece vir para acompanhar a espera. Não sei se é uma influência de Gato Barbieri e suas trilhas de cinema. Mas o som rascante e doce, as notas prolongadas com o fole se abrindo, a atmosfera de um passado alheio, tudo parece compor adequadamente essa hora. Uma suspensão quase forçada de tempo antes do embarque. Porque o sentido das estações de trem está no embarque.
Talvez não o ritmo quebrado e vigoroso de um tango tradicional. Ou o alegre vibrar do baião. Talvez o acordeon ecoe mais a sonoridade de uma canção parisiense ou de uma seresta do interior paulista. Traz uma tensão leve, suportável, que captura o ouvinte para sua história. Convida para um terreno estranho, chão que se move e deixa intranqüilo, mas ao mesmo tempo conforta com seus acordes compassivos.
Nas estações a solidão é mais amena. Tem o sentido de uma passagem. Escuridão com fundo. De uma cidade que mal se reconhece, do movimento dos que migram. Não buzinas nem sirenes. Conversas destoantes. E aquele som.
[O belo show de Mônica Salmaso (voz) e Toninho Ferragutti (acordeon) está em cartaz no Teatro Fecap, Liberdade, São Paulo, até o dia 22]