Tuesday, July 05, 2011

Anti-espelho sonoro

Parece sempre estranho ouvir a própria voz gravada, qualquer que seja o meio: secretária eletrônica do telefone, computador, gravador digital. Não é, de forma alguma, um espelho sonoro. Ela te fala de algum lugar muito distante. Alguma arca reaberta em uma plataforma distorcida. Que insiste em devolver um texto já rompido, abandonado.

Não é você mesmo, mas guarda alguma familiaridade. Talvez em algumas vogais escuras, muito breves e quase imperceptíveis. Ou naqueles tiques de longa existência, que os ouvintes atentos podem reconhecer.

Mas é outra voz, mais aguda, mais grave. Outra alma confrontada na invisibilidade, nessa ponte de mão única. Ela se repete cada vez diferente a alguém que parece não mais lembrar como foi chegar a esse outro lado. Uma voz desnaturada, suspensa no tempo.

Ela perturba o viajante nas horas pares quando tenta trazer companhia sem ao menos causar um tremor.

:: foto: detalhe do Ohtake Cultural, em Pinheiros, São Paulo, por R.I.

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