Sempre vi o mundo menor do que era. Por conta das lentes divergentes a imagem corrigida se mostrava reduzida. Nenhuma coisa tinha uma exata correspondência, como distância alguma deveria ser real.
Durante anos os óculos comprimiram a vida e a filtraram numa espécie de cinema sem tela fixa. Eles tornavam nítido o que era preciso, ainda que não necessariamente. Exato, apenas quando desfocado, borrado.
Talvez isso tenha contribuído para criar uma desconfiança quanto à veracidade do que se apresenta à vista. A realidade parece se decompor em graus a um movimento das mãos. Não é nada muito certa, nem se estende na medida do que se percebeu da primeira vez.
:: foto: detalhe da obra ‘Microscópio para São Paulo’, de Olafur Eliasson, na Pinacoteca do Estado, em São Paulo, por R.I.
Ele aproximava as cores da sensação de liberdade. As cores de cada vida: frutas, flores, pássaros, ventos. Para onde quer que olhasse encontraria ainda um rastro, um memo, passos de luz restante. Em cada cor aprofundou sua pausa. Deitou sua calma e se deixou ficar. Não adormeceu. Antes, foi como acordar de um salto, perder o rumo e jogar cada pedaço embora.
:: foto: detalhe da instalação ‘Seu corpo da obra’, de Olafur Eliasson, no Sesc Pompéia, São Paulo, por R.I.
Começo de noite, parque para fechar, alguns gatos surgem por toda a parte. São brancos e pretos, parecem tranqüilos. Não há final de história para eles. Nas alamedas vazias estão sentados ou deitados, lambem o corpo e são indiferentes aos visitantes que passam. Estarão se sentindo sós?
As luzes são acesas. Menos movimento ainda. O pavão no alto da árvore entoa seu canto. O domingo continua a findar.
Pelas ruas quase ninguém. Assim é por muitas horas, cada vez mais escuro. E mais uma vez aparecem pálidas imagens, cortadas feito feixes à frente, no piso, contra as paredes. Definham como os passos, lentos.
Não há chegada. E nem termina por completo.
:: foto: detalhe de ‘Seu Planeta Compartilhado’, instalação de Ólafur Eliasson, no belvedere da Pinacoteca do Estado, no bairro da Luz, em São Paulo, por R.I.
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