Foi mais um cansaço. Pode ter passado, assim como outros, das vezes em que lhe chamei, acenando com ingressos para algum espetáculo.
Não sei com quantos cansaços se faz uma espera. Eles se gastam, como as horas, os pisos, por onde andarei mais e mais, contando janelas, contando as vezes. E lhe abandonarei.
:: foto: detalhe do edifício Sampaio Moreira, no centro de São Paulo, por Ricardo Imaeda
[ao som de ‘Here comes the sun’, de George Harrison, na voz emocionante de Nina Simone]
Em ‘O caminho para Meca’, vemos Helen cada vez mais fragilizada, na iminência de não mais poder cuidar de si mesma. Sentindo-se pressionada a mudar para um asilo, ela se contrai, curvada à mesa, quase desabando sobre uma vela. Na sua deriva imóvel ao destino ela nos arrepia as cordas da compaixão.
Não demora muito e do que parecia desoladamente perdido ela se levanta para falar sobre a sua arte que, como as velas que acendia, a ajudavam a confrontar o medo, e o medo da escuridão. Agora sua voz vem firme, as velas em punho, no percurso que ainda lhe resta.
Suas esculturas iluminam um caminho em meio a toda a incompreensão e intolerância que a sua diferença provoca. As velas que ela abraça tremem ainda, a sala anoitecida, enquanto olhamos em defesa do que parece minguar, parece apagar, mas resiste.
: [Cleyde Yáconis brilha intensamente na peça ‘O caminho para Meca’, um texto forte de Athol Fugard, em cartaz no teatro Jaraguá, em São Paulo, de sexta a domingo. Durante o mês de novembro está com preço promocional na campanha da Apetesp]
:: foto: detalhe de painel de Di Cavalcanti na fachada do prédio do hotel e do teatro Jaraguá, no centro de São Paulo, por Ricardo Imaeda
A realidade é mais surpreendente e criativa do que poderia imaginar qualquer ficção. Assim, é legítimo esperar, como é razoável sonhar. E dessa matéria talvez retirem alimento aqueles que caminham.
Quase ao final uma história ganha reviravoltas e o cenário muda. Decisões de alguns poucos repercutem, ampliadas, em um efeito de onda, para chegar onde não deveriam.
Os motivos muitas vezes não importam, porque os giros do acaso embaralham os planos.
Serão eles os reconhecidos tanto tempo depois?
:: foto: vista sul, a partir do mirante da Vila Madalena, região oeste de São Paulo, por Ricardo Imaeda
Ao som de ‘Amazing Grace’, na extraordinária voz de Jessye Norman
uma escolha tão esperada tem chance de se consagrar e um sentimento de partilha se estende por latitudes e longitudes porque se reencontra um dia o que não se deixou levar
Gostaria de ler sua sugestão ou comentário. Se preferir, escreva direto para mim. Será um prazer começar uma nova amizade ou apenas compartilhar palavras e significados.