Sunday, May 28, 2006

Para viver em duas horas


O que cabe dentro de duas horas?

Desde que foi implantado o bilhete único no transporte coletivo da cidade de São Paulo, esse é o intervalo de tempo em que se pode deslocar por até quatro viagens ao preço de uma tarifa. Tempo de um longa-metragem, aula de inglês, de lavar e secar roupas nas lavanderias, tomar vários cafés e pensar na vida.

Quem souber planejar bem o roteiro tem chance de pagar as contas no banco, cuidar de outras necessidades burocráticas, fazer compras no supermercado. Pode até se dar ao luxo de caminhar lentamente pelas ruas para diferir passos e ritmos.

O prazo do bilhete serve para organizar de alguma forma a vida no espaço fora de casa, ainda que apenas para maximizar o rendimento. A corrida contra o tempo ganha um pretexto real, contabilizável. Novamente é o primado das demandas geradas na exterioridade. Mas, enfim, também permite pesar durações e validades de rotinas e ações esporádicas. Uma espécie de sino, que desperta para o valor das coisas, que faz pensar duas vezes, mesmo que instigado inicialmente pelo filtro do custo monetário.

Tanta coisa dura menos que duas horas. Tanta coisa se arrasta por até duas horas. Dá para chorar e se recompor, enquanto se espera o ônibus certo, como uma senha perdida, um itinerário esquecido. Mas que pode levar de volta. Voltar.

3 comments:

Anonymous said...

Ricardo, fui ao antigo blog e caí aqui, isto é, vim pra cá. Gostei muito, muito. A página está bonitíssima, os textos, como sempre, excelentes, cheios de beleza e reflexão que nos levam também à beleza e reflexão. Obrigada, beijo, abraço.
Anaelena

Anonymous said...

Esqueci de lhe dizer que Lon-Sao - escrever para compreender - é outra beleza.

Anonymous said...

I say briefly: Best! Useful information. Good job guys.
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